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Talentos do Bairro

Talentos do Bairro volta a lançar estrelas em Lisboa

A segunda edição do concurso de talentos da Gebalis inicia-se amanhã nas pré-eliminatórias com artistas dos bairros municipais de Lisboa nas áreas de música, dança e artes performativas. O kick off deu-se com o lançamento do álbum de originais de um dos vencedores da primeira edição, o rapper Don Fran. A grande final será a 6 de dezembro, no Capitólio.


Publicado a 31 de Outubro de 2025 às 10:29

Talentos do Bairro volta a lançar estrelas em Lisboa

Don Fran, 37 anos, que ficou em 3º lugar na primeira edição, já lançou um álbum de originais

Há um ano, o rapper Don Fran dificilmente contrariava o anonimato de apenas uma música no Spotify. Um dos 16 finalistas do concurso Talentos do Bairro, lançada pela Gebalis em 2024 em parceria com a Medialivre, o músico gravou um álbum de originais depois dessa participação e acrescentou mais 12 canções ao reportório.

Don Fran, que ficou em terceiro lugar na final do Talentos do Bairro, é um dos rostos do sucesso da primeira edição do evento, que regressa a Lisboa a partir de amanhã, desta vez num formato mais abrangente e envolvente.

A organização recebeu dezenas de candidaturas no arranque desta segunda edição. As pré-eliminatórias iniciam-se já este sábado, 1 de novembro, em três palcos de Lisboa e terão lugar exclusivamente no mês de novembro. Serão quatro sessões de apuramento dos finalistas, que subirão ao palco da sala de espetáculos do Capitólio na Grande Final, a 6 de dezembro.

Cada pré-eliminatória contará com atuações de artistas locais, votação do público e avaliação de um júri, definindo três vencedores — dois eleitos pelo júri e um pelo público —, que serão distribuídos pelas quatro sessões.

Vários bairros municipais lisboetas estarão representados no evento porque os moradores apresentaram candidaturas — casos de Boavista, Bom Pastor, Sargento Abílio, Quinta do Cabrinha, Charquinho, Alta de Lisboa, Ameixoeira, Armador, Condado, Padre Cruz, Alfinetes, Ourives e Quinta do Chalé.

Os residentes destes bairros são os destinatários da iniciativa da Gebalis, empresa pública municipal, que gere um património de cerca de 23 mil habitações, onde residem 62 mil pessoas, no centro das prioridades. Um conjunto de vulnerabilidades tem impedido a valorização dos talentos destes bairros municipais. O Talentos do Bairro é um dos projetos que procura minimizar essas desigualdades.

Gebalis tem “entusiasmo e orgulho”

“Mais do que um concurso, é um projeto que reforça o sentimento de pertença e valoriza o que de melhor se faz nos bairros municipais — transformando o palco num verdadeiro espaço de reconhecimento, de partilha e de valorização pessoal e coletiva”, explica a coordenadora do departamento de Projetos de Intervenção Comunitária da Gebalis, Marlene Almeida.

Os 135 participantes na primeira edição e mais de 2,5 milhões de pessoas impactadas em televisão e 4,5 milhões de impressões digitais, motivaram o regresso do projeto de forma mais abrangente e envolvente. “Esta segunda edição nasce do entusiasmo e do orgulho gerados pela primeira. Muitos dos que agora participam estiveram no público no ano passado e sentiram-se inspirados a inscrever-se; outros regressam com mais confiança e determinação. Os artistas sentem que este é o seu palco, um espaço onde são vistos e valorizados. O Talentos do Bairro é um espaço de expressão e reconhecimento que reforça a autoestima e os laços comunitários”, reforça a responsável.

Esta segunda edição nasce do entusiasmo e do orgulho gerados pela primeira. (…) O Talentos do Bairro é um espaço de expressão e reconhecimento que reforça a autoestima e os laços comunitários.

Neste ano, a Gebalis procura “consolidar os Talentos do Bairro como uma iniciativa que valoriza o talento e a expressão artística das comunidades, depois do entusiasmo e da adesão que marcaram a primeira edição, com a descoberta de muitos valores”.

O projeto manteve-se ativo ao longo do ano, com vários participantes da primeira edição a terem novas oportunidades de atuação e visibilidade. «Este percurso mostra que o Talentos do Bairro é mais do que um concurso: é um ponto de partida para que os artistas continuem a crescer e a afirmar-se na cidade”, frisa Marlene Almeida.

Don Fran a caminho do estrelato

Residente na Alta de Lisboa, Don Fran era praticamente um desconhecido até terminar a primeira edição do Talentos do Bairro na terceira posição. Desde então, o músico tem subido as escadas do reconhecimento. Gravou um álbum, Alma 3048 — uma homenagem aos pais, Alcina e Manuel, aliada à memória do número de porta da casa onde viveram —, concretizando “um sonho de criança”. O trabalho, tal como o artista, está presente em todas as plataformas de música e também é dado a conhecer nas redes sociais.

“Em 2024, tinha uma música no Spotify com quatro anos. Atualmente tenho mais 12 temas, resultantes de um álbum. Comecei a ganhar coragem depois do Talentos do Bairro”, conta Don Fran que, fazendo jus à vocação universal do projeto, destinado a participantes de qualquer idade, já completou 37 anos.

O Talentos do Bairro abriu-me as portas para um início de carreira. Deu-me a oportunidade de cantar os meus temas, de lançar o meu álbum. Isto prova que qualquer pessoa pode agarrar e aproveitar estas portas abertas, se quiser.

Um dos momentos mais felizes da vida de Don Fran aconteceu na apresentação do Alma 3048 na presença de familiares e amigos, que se têm encarregado da partilha do álbum, com “feedback positivo”. Também cantou nas Festas de Lisboa, acompanhado da banda, sempre com o apoio da Gebalis.

“O Talentos do Bairro abriu-me as portas para um início de carreira. Deu-me a oportunidade de cantar os meus temas, de lançar o meu álbum. Isto prova que qualquer pessoa pode agarrar e aproveitar estas portas abertas, se quiser”, defende Don Fran.

Dar voz ao bairro

A estratificação social também é um dado mencionado pelo músico, que ancora o projeto da Gebalis à discriminação dos residentes em bairros municipais: “O concurso abre as portas a quem não tem a oportunidade de mostrar o talento, face ao grupo social. Nunca pensei pisar o Capitólio vindo de um bairro”.

A mudança da imagem destes bairros, “abrindo portas, criando pontes e dando voz a quem nem sempre a tem”, é o propósito de cada projeto comunitário da Gebalis, como confirma Marlene Almeida. “A Gebalis trabalha diariamente para promover a participação, o diálogo e o sentido de comunidade. Projetos como o Talentos do Bairro mostram uma realidade muitas vezes invisível: a de pessoas com talento e vontade de crescer. Estas iniciativas ajudam a desconstruir preconceitos e a reforçar uma imagem positiva dos bairros municipais, centrada nas suas pessoas e nas suas histórias.”

Mikaela Andrade, diretora de intervenção local da Gebalis, no lançamento do álbum de Don Fran
Mikaela Andrade, diretora de intervenção local da Gebalis, no lançamento do álbum de Don Fran

Mikaela Andrade, diretora de intervenção local da Gebalis, no lançamento do álbum de Don Fran

Neste ano, as inscrições decorreram entre 9 de junho e 17 de outubro, através do ‘site’ oficial da iniciativa. Aberta a residentes num dos bairros da rede Gebalis, convidados a submeter um vídeo de dois minutos com uma atuação nas áreas de música, dança ou artes performativas. Foram aceites atuações individuais ou em grupo (até 8 elementos).

Entre os inscritos para a segunda edição estarão os finalistas que voltarão a discutir a vitória na grande final. Don Fran recorda que “é importante ninguém desistir porque tudo se desenrola a partir da subida ao palco para mostrar o talento”. E aconselha outros sonhadores como ele numa carreira a acreditarem nas suas capacidades durante o processo de seleção no Talentos do Bairro: “Ninguém pode pensar numa participação sem acreditar no talento e transformá-lo. Um todo levou-me à final, numa mistura de voz e atuação”.

A força do estigma

A capacidade de superação dos residentes destes bairros quando sobem ao palco surpreendeu Rogério Paulo, que volta a integrar o júri do concurso. “Há muita qualidade nestes bairros, da qual nem nos apercebemos normalmente. Conheço várias pessoas destes meios com as quais me cruzo regularmente e de repente vi-as a atuar e a transcender-se e com muita qualidade”, elogia o jurado, ator e fundador do Teatro Comunitário de Carnide.

O ator sente-se “tocado” com a forma como os habitantes recebem a iniciativa da Gebalis. Consideram-na “muito importante” porque representa uma rara oportunidade de se mostrarem. “Sentem-se valorizadas, reconhecidas e agradecidas”, conta Rogério Paulo, cujo trabalho o tem levado a contactar de forma próxima com estas comunidades nos últimos anos.

“Estas pessoas sentem-se colocadas à margem. Em termos geográficos, estes bairros também estão situados fora do centro da cidade. Os seus habitantes são vistos como pessoas dos bairros e este estigma contribui para se fecharem e desvalorizarem. O evento tira as pessoas deste estigma e mostra que estas comunidades são feitas de pessoas com os mesmos talentos das outras”, defende o ator.

As evidências também contrariam essa perceção negativa porque “há pessoas carenciadas em termos económicos cujos filhos estudam no Conservatório, outras que se vão formando no autodidatismo, belíssimas vozes e executantes de instrumentos clássicos ou menos convencionais”. Uma “diversidade impressionante com enorme potencial, que merece continuar”.

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